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 Título original: "Tucker's Kobold". Editorial escrito originalmente por Roger E. Moore na revista "Dragon", edição número 127, Vol. XII nº 6, publicada originalmente em 02 de novembro de 1987. 

Traduzido por Felipe Tuller. 


O editorial deste mês é sobre os kobolds de Tucker. De vez em quando, recebemos cartas pedindo conselhos sobre como criar aventuras para personagens de níveis altos em AD&D®, e os kobolds do Tucker parecem se encaixar perfeitamente nessa proposta.
Muitos personagens de níveis altos não têm muito o que fazer porque não se sentem desafiados. Eles bocejam diante de um tarrasque e precisam ser mantidos acordados à força quando um lich aparece. Os Mestres envolvidos não sabem o que fazer, então acabam ignorando o problema, e os personagens caem no Limbo dos Personagens. Chegar a níveis altos é difícil, mas fazer coisas interessantes depois de chegar lá é ainda pior.
Um dos principais problemas no design de aventuras é criar oponentes que consigam desafiar personagens poderosos. Monstros únicos, como tarrasques e liches, são fáceis de enfrentar em grupo; a equipe pode concentrar seus poderes no alvo até que ele caia morto com as patinhas para cima. Tentar criar monstros mais poderosos do que um tarrasque é declarar derrota; se o grupo matar seu supermonstro, o que você vai fazer depois? Chamar a mãe do mostro? Isso não funcionou com Beowulf, e provavelmente também não vai funcionar aqui.
Pior ainda: supermonstros individuais raramente precisam pensar. Eles apenas usam sua confiável e previsível sequência de ataques garra/garra/mordida. Isso não deveria ser o padrão de qualidade de uma campanha. Esses jogos perdem força porque não oferecem desafios aos jogadores, nem estímulo mental — nem um perigo real.
Em todos esses jogos que eu já presenciei, os piores, os mais horríveis, os mais terríveis inimigos que enfrentamos eram, muitas vezes, mais fracos do que os personagens que lutavam contra eles. Eram apenas seres bem armados e inteligentes, interpretados pelo Mestre de maneira a serem absolutamente implacáveis e astutos. Os kobolds do Tucker eram assim.
Tucker mestrava uma masmorra incrivelmente perigosa na época em que eu estava destacado no Forte Bragg na Carolina do Norte. Essa masmorra tinha corredores que transformavam todos os nossos burros de carga em demônios flamejantes gigantescos ou que lançavam o grupo inteiro em piscinas de ácido, mas os demônios pareciam brincadeira de criança se comparados aos kobolds do Nível Um. Esses kobolds eram apenas kobolds normais, com 1d4 pontos de vida e tudo mais, mas eles eram malvados. E quando eu digo malvados, quero dizer maus mesmo, Jim. Eles se formaram magna cum laude no Instituto Sauron para Criminosos Crueis.
Quando entrei no grupo de jogo, alguns dos personagens já haviam encontrado os kobolds do Tucker, e eles não estavam nem um pouco ansiosos para repetir a experiência. O líder do grupo examinou o mapa da masmorra que eles haviam criado e tentou encontrar alguma forma de evitar os tais bichinhos, mas era impossível. O grupo se resignou a tentar correr pelo Nível Um até alcançar os elevadores, onde poderíamos descer ao Nível Dez e enfrentar monstros “aceitáveis”, como os demônios flamejantes gigantescos.
Não funcionou. Os kobolds nos alcançaram cerca de 18 metros dentro da masmorra, trancaram a porta atrás de nós e a barraram. Depois, incendiaram o corredor, enquanto ainda estávamos nele.
“NÃÃÃÃO!!!” gritou o líder do grupo. “São ELES! Corram!!!”
Encorajados dessa forma, nosso grupo disparou por um corredor lateral,  apenas para cair numa emboscada de mais kobolds disparando bestas leves através de frestas e buracos nas paredes e no teto. Kobolds com armaduras de metal e escudos lançavam coquetéis molotov contra nós por trás de grandes montes de entulho em chamas, que outros kobolds empurravam adiante com longas hastes de metal, como se fossem vassouras. Não havia dúvida. Aqueles kobolds eram maus.
Viramos a cabeça para o nosso líder em busca de orientação.
“AAAAAAGH!!!” ele gritou, levando as mãos aos rosto para não ter que confrontar a realidade da situação tática.
Nós abandonamos nossos burros e a maior parte dos ítens que carregávamos nas costas para tentar acelerar a nossa fuga em direção aos elevadores, mas fomos interceptados por kobolds franco-atiradores que conseguiam se mover e atirar, recuando para trás de pedras e cantos após atirar flechas, virotes com ponta de aço, lanças, machadinhas e mais frascos de óleo em chamas. Nós fugimos por uma área inexplorada do Nível Um, tomando dano o tempo todo. Foi aí que descobrimos que os kobolds haviam transformado o primeiro nível num verdadeiro formigueiro de túneis pequenos para conseguirem se mover mais rapidamente. Havia kobolds atuando como soldados comando em toda parte. Todos os nossos mercenários morreram. A maioria dos ajudantes também. Nós éramos os próximos.
Eu lembro que havia um mago de nível 12 conosco, e pedimos a ele para lançar alguma magia. “Detona eles!” gritamos enquanto corríamos. “Bola de fogo neles! Acaba com esses @#+$%*&!!”
“O quê?! Nesses corredores estreitos?” ele gritou de volta. “Vocês querem que a gente exploda junto deles?”
Nossa fuga desesperada nos levou a um corredor sem saída, onde um imenso tubo de ventilação descia direto rumo a uma escuridão indescritível, muito além do Nível Dez. Ali, de modo apressado e atrapalhado, nós cravamos estacas no chão e nas paredes, lançamos cordas pela beirada e descemos direto rumo àquela escuridão indescritível, porque qualquer coisa que nos esperasse lá embaixo com certeza seria melhor do que aqueles kobolds.
Nós escapamos, encontramos alguns demônios flamejantes gigantescos no Nível Dez, e até conseguimos matar um deles depois de cerca de uma hora de combate no qual perdemos metade do grupo. Nos sentimos revigorados, mas ninguém conseguia animar o líder do nosso grupo
“A gente ainda vai ter que sair pelo mesmo caminho por onde entramos”, disse ele, sorumbático, enquanto começava a dividir o tesouro.
Os kobolds do Tucker foram a pior coisa que conseguimos imaginar. Eles comeram todos nossos burros, roubaram nosso tesouro e fizeram tudo o que podiam para nos fazer sofrer. Apesar disso, eles tinham estilo, cérebro, tenacidade e coragem. Nós tínhamos respeito por eles e até amor, de certa forma, porque eles nunca eram entediantes.
Se kobolds conseguiram fazer isso com um grupo de personagens entre os níveis 6 e  12, imagine o que alguns orcs e NPCs de nível baixo podem fazer com um grupo de nível 12 ao 16, ou uma gangue de NPCs e monstros de nível médio contra grupos de até 20º nível. Então teste isso. Às vezes, são as pequenas coisas — quando bem usadas — que fazem a diferença.
https://ia803109.us.archive.org/BookReader/BookReaderImages.php?zip=/8/items/DragonMagazine260_201801/DragonMagazine127_jp2.zip&file=DragonMagazine127_jp2/DragonMagazine127_0000.jp2&id=DragonMagazine260_201801&scale=4&rotate=0

Título original: "The Copy and Paste Manifesto". Escrito originalmente por Joshua McCrowell no seu blog intitulado "Rise Up Comus" em 20 de maio de 2025. 

Traduzido por Felipe Tuller. 

 

Eu já afirmei publicamente que criar um megadungeon é fácil e divertido. Eu escrevi um livro sobre isso.

Mas eu tenho boas notícias. É ainda mais fácil do que eu fiz parecer.

Quero apresentar a você um ethos para seu jogo, chamado...

O Manifesto do Copia e Cola

Na introdução de That Hideous Strength, C.S. Lewis faz referência ao escritor de ficção científica Olaf Stapledon e a sua obra: “O Sr. Stapledon é tão rico em inventividade que pode muito bem emprestar isso, e eu admiro sua inventividade (embora não sua filosofia) tanto que não sentiria vergonha alguma em tomá-la emprestada.”

Eu gostei dessa citação desde a primeira vez que a li e já a peguei emprestada diversas vezes. De fato, sempre que eu roubo ou crio algo a partir do trabalho de outras pessoas, costumo citá-la, inteira ou em parte. Eu acho extremamente satisfatório ter roubado essa ressalva de dizer: “Ei, estou roubando isso de alguém.”

Você também pode ter ouvido a frase frequentemente atribuída erroneamente: “Bons artistas copiam, grandes artistas roubam.”

Estou aqui para dizer que é exatamente assim que você deveria conduzir suas mesas.

Amando o manifesto

Não existe a masmorra perfeita. Quando você mestra The Yellow Book of Brechewold, você sente que o subnível da nave élfica pende demais para a ficção científica para seu jogo de fantasia, então você o remove. (Manifesto do Cortar, Copiar e Colar não tem uma sonoridade tão boa, mas cortar também faz parte.)

Não existe a campanha perfeita. Quando você mestra Dolmenwood, você quer começar os jogadores em Brandonsford (a vila de Black Wyrm of Brandonsford) para dar a eles imediatamente uns ganchos de conto de fadas e algumas missões dos NPCs locais. Você pega Brandonsford e a encaixa no hexágono 1205.

Não existe o megadungeon perfeito. Só existe a colcha de retalhos de masmorras costuradas à mão. Você junta duas masmorras de Silent Titans, Lost Caves of the Worm Witch de Sersa Victory e o Nexus of the Ix (da revista Knock! #3). Você conecta todas elas de uma forma temática e pelo uso de um mapa.

Não existe o jogo perfeito. Você roda OSE, mas pega as regras de abrir fechaduras de Errant, os pacotes de equipamento inicial de Cairn, e os procedimentos de XP retirados de uma postagem de um blog que você leu uma vez.

Existe tanto conteúdo bom por aí. O Manifesto do Copiar e Colar diz para você usar tudo isso. Crie o jogo perfeito para você, combinando todas as suas preferências e cortando tudo o que não gosta.

Chega de lamentar que você nunca vai conseguir usar aquele tal livro na mesa. “Quando terei tempo para mestrar mais uma aventura? Quem toparia jogar esse novo sistema comigo?” Não, cale a boca. Esse não é o motivo pelo qual você compra livros. Você os compra para roubar deles.

Vivendo o manifesto

Quando eu fiz o playtest de His Majesty the Worm, meu megadungeon era uma vasta coleção de conteúdos copiados e colados. (É por isso que nunca mostrei isso a ninguém.)

Eu quero que você faça o mesmo que eu fiz. Veja como:

Passo 1: Pegue uns mapas

Esses mapas podem ser feitos por você, gerados aleatoriamente com alguma coisa tipo o Watabou, criados por um cartógrafo profissional ou uma combinação dessas opções.

Passo 2: Numere as salas

Numere as salas com códigos de três dígitos (como recomendado por His Majesty the Worm). O Nível 1 terá as salas 101, 102, 103 etc. O Nível 2 terá 201, 202 e assim por diante.

Passo 3: Dê início à sua ficha de referência da masmorra

Use um Google Docs. Marque as diferentes masmorras como Título 1. Marque as salas como Título 2. Configure os estilos dos Títulos para que fiquem bonitos.

Passo 4: Pegue masmorras

Acesse aquela sua pasta de suplementos, aventuras e masmorras de RPG que está em constante crescimento e comece a abrir os PDFs.

Passo 5: Copie e cole

Pegue os melhores conteúdos e comece a copiá-los para seu Google Docs. Encontre temas que façam tudo funcionar em conjunto. Corte o que você acha que não combina com seu estilo. Talvez o Nível 1 venha praticamente inalterado de uma única fonte, mas reorganizado para se adaptar ao seu novo mapa e criar conexões com o Nível 2. Talvez você decida colocar um NPC do Nível 3 no Nível 1, criando uma linha de continuidade entre a entrada e uma seção mais profunda da masmorra.

Passo 6: Repita, infinitamente

Compre mais jogos. Adicione mais seções ao seu mundo. Deixe os jogadores viajarem de Dolmenwood até o Vale das Flores. Quando eles adormecerem, acordarão em Zyan.

Copie, cole, misture, modifique e crie o jogo perfeito para você e sua mesa.

Já que eu tenho a sua atenção: a campanha de Knock! #5 está quase se encerrando

Um dos lugares principais de onde você pode copiar conteúdo é a revista Knock!. Sempre que eu inicio uma nova campanha, releio todas as edições antigas. Há tantas ideias boas, tantas regras roubáveis, tantas tabelas incríveis, tantas engenhocas legais. Isso sempre estimula minha mente e me deixa empolgado.

No momento em que escrevo, faltam menos de dois dias para o fim da campanha no Kickstarter. Não perca essa chance!

Exorcise seu FOMO garantindo a sua cópia!

 




 

 Título original: "Monster Checklist". Escrito originalmente por Arnold Kemp no seu blog intitulado "Goblin Punch" em 18 de novembro de 2024. 

Traduzido por Felipe Tuller. 

Ok, então você está criando um monstro. Dê uma olhada nos pontos dessa lista para garantir que não esqueceu de nada.

1. O conceito deve ser único, envolvente e comunicável

Você provavelmente tem muitas ideias na cabeça, mas quais delas realmente criam um bom monstro?

Você quer algo que seja diferente do que seus jogadores já enfrentaram (único), que seja interessante o suficiente para prender a atenção deles (envolvente) e que seja algo que você consiga descrever (comunicável).

Tipo assim, muitos conceitos de monstros lovecraftianos podem atender aos dois primeiros critérios, mas se você não conseguir descrever como ele se parece e como ele luta, ele será apenas um amontoado de pontos de vida diante dos jogadores (Miniaturas ajudam com isso, mas não eliminam esse requisito).

Também pode valer a pena pensar em como o monstro será descrito por você na mesa (e por outros mestres também). Os melhores monstros são aqueles que podem ser conceituados em uma única frase, embora você possa usar frases adicionais para enfeitá-los.

Lub Glubs de Hora de Aventura
(Eles parecem boias de piscina à deriva até a hora que se aproximam).


2. O monstro deve ser divertido de enfrentar

Estamos falando de monstros, então é provável que o combate esteja envolvido. Seu monstro precisa ser divertido de lutar contra. Isso é gerado por: (2a) Habilidades, (2b) Táticas, (2c) Ambiente e (2d) Fraquezas. Cada um desses pontos merece uma discussão mais aprofundada, então falarei sobre eles em suas respectivas seções a seguir.

Então, vamos voltar a falar de coisas que tornam o combate divertido. Habilidades, táticas, ambiente e fraquezas.

2a. As habilidades devem ser apropriadas, inovadoras e dinâmicas

Por "apropriadas", eu quero dizer que a representação mecânica deve corresponder à ficção. Em um nível básico, um sopro de fogo deve causar dano de fogo, mas e um martelo fantasma? Ele causa dano contundente ou dano de força? Qual é a melhor maneira de lidar com um lich que drena sua vida? Drenar nível, dano de Constituição, redução do PV máximo, exaustão ou redução de dados de vida?

Nesse ponto você tem bastante liberdade, então seja criativo. Jogadores apreciam quando uma mecânica é especialmente bem encaixada na temática, mas isso não é obrigatório.

Por "inovadoras", quero dizer que você deve tentar oferecer algo que os jogadores ainda não viram. Se você está escrevendo uma aventura, é essencial que os conceitos sejam bem diferenciados entre si. (Se for um bestiário, você pode criar alguns monstros similares entre si, já que é improvável que o mestre faça com que os jogadores enfrentem todas as 7 variedades de dragões em sequência).

Por "dinâmicas", quero dizer que as habilidades devem levar os jogadores a tomar decisões interessantes. Sopro de fogo é legal e ameaçador, mas não é dinâmico. Os jogadores simplesmente tomam o dano e seguem a vida — não há escolhas a serem feitas. Já um Muro de Fogo é mais dinâmico, pois divide o grupo e os força a decidir entre pular através do fogo ou esperar que ele desapareça.

2b: Táticas também devem ser apropriadas, inovadoras e dinâmicas

Você não precisa de habilidades especiais para ter um encontro interessante. Eu criei uma postagem sobre como as táticas podem diferenciar monstros mecanicamente idênticos. Não vou repetir tudo aqui, mas, resumindo: os diferentes monstros da sua masmorra devem ter motivações distintas para se oporem aos jogadores (comida? defesa?), diferentes papéis no combate (bate e corre? agressão cega?), diferentes objetivos de combate (comer você? roubar você? escapar?) e diferentes níveis de comprometimento com o combate (moral).

Coisas simples, como modos de movimento e ataque, também podem sugerir táticas interessantes. Por exemplo, um arqueiro esqueleto voador não precisa de habilidades especiais, porque os jogadores já terão que bolar estratégias diferentes para derrotá-lo (em comparação com lutar contra esqueletos comuns).

#2c: O ambiente também deve ser apropriado, dinâmico e/ou interativo

Alguém poderia argumentar que isso pertence mais ao design de aventuras do que ao design de monstros, mas os dois estão interligados. O combate nunca deve ocorrer em uma sala branca sem características, e certos monstros são mais adequados para certos locais.

O ambiente de um arqueiro esqueleto voador pode ser um penhasco solitário onde eram realizados sepultamentos flutuantes. Ou talvez uma ponte antiga de onde um culto de pássaros fazia sacrifícios. Ou ainda, um sistema de catacumbas com “ninhos” de ossos empilhados nas paredes mais altas.

A interatividade vem de perigos e terrenos difíceis, mas também de vantagens: cobertura, gargalos, esconderijos. Explore também a verticalidade: escadas, andares, mezaninos, escadas de mão, fossos, encostas íngremes (“trepadeiras”) e piscinas.

Além disso, considere como o ambiente afeta os encontros. Um teto baixo torna um arqueiro esqueleto voador muito mais fácil de derrotar. Por outro lado, se a sala tiver um teto alto e for dividida por um fosso, arqueiros esqueletos voadores se tornam muito mais ameaçadores.

#2d: Todo monstro precisa de fraquezas (sejam implícitas ou explícitas)

Se nenhum dos monstros tiver fraquezas, os jogadores usarão sempre as mesmas táticas ofensivas para derrotá-los. A fraqueza pode ser implícita, como um inimigo voador ser “fraco” contra ataques à distância e redes, ou um inimigo estúpido ser fácil de atrair para uma armadilha.

Ou então a fraqueza pode ser explícita, como espantalhos sendo fracos contra fogo. Não sou muito fã de fraquezas absolutas que exigem um material ou feitiço específico. Coisas como “Imune a dano de armas não prateadas” ou “Possessão só pode ser encerrada com Proteção contra o Mal”. Se o grupo tem uma adaga de prata, não há nenhuma decisão interessante – eles simplesmente a usam. E se o grupo não tem, eles fogem, e novamente não há uma escolha a ser feita. (“trancas absolutas”*1 desse tipo podem funcionar como “chaves” no estilo metroidvania, no qual um monstro é intransponível até que o grupo volte com armas prateadas, mas esse ainda é um design fraco, ao meu ver).

Eu prefiro fraquezas de “tranca fraca”. “Esse inimigo sofre dano dobrado de armas de prata” ou “Possessão pode ser encerrada com Proteção contra o Mal, água benta ou ao deixar o alvo inconsciente”.

As melhores fraquezas são versáteis, permitindo maior flexibilidade nas abordagens dos jogadores. “O cérebro desse monstro está exposto e ele sofre dano triplo quando atacado de cima” ou “100% motivado por comida” ou “tem medo de barulhos altos” ou “morre por queda”. No entanto, esse design te limita um pouco, já que você precisa criar opções que  qualquer grupo de aventureiros possa ter acesso, então você não deve usar exclusivamente fraquezas versáteis – você também deve incluir algumas fraquezas no estilo tranca fraca.

Lembre-se também de que fraquezas podem assumir a forma de benefícios para os jogadores. Um monstro voador com um ataque à distância pode ser ameaçador, mas se ele conceder a todos dentro de 15 metros a habilidade de voar, isso introduz a novas táticas e e novos riscos. Da mesma forma, um monstro cego com um olfato horrível permite que os jogadores efetivamente “fiquem invisíveis” enquanto lutam contra ele, o que abre espaço para táticas novas e interessantes.

#2e: Considere ameaças além de "isso te mata". Considere soluções além de "você conseguiu matá-lo"

O assassinato é uma linguagem comum no RPG de mesa. Uma luta até a morte é instantaneamente interessante e é um foco comum das mecânicas de jogo. Mas, por favor, pense fora dessa caixa.

Eu falei sobre tipos alternativos de ameaças no item #5, mas também considere que os jogadores podem "vencer" o combate através de outras condições de vitória:

  • Impedir que os monstros fujam e soem o alarme.
  • Evitar quebrar os vasos inestimáveis desta sala enquanto os monstros tentam te matar.
  • O monstro é um sábio. A cada rodada, você pode fazer uma pergunta que a cabeça da esquerda responderá com a verdade. Enquanto isso, a cabeça da direita (e o resto do monstro) está tentando te matar. Fique vivo e pense em boas perguntas.
  • O monstro é o tesouro, mas apenas se for morto de uma maneira específica.

Esse também é um motivo pelo qual temos monstros com fraquezas específicas – para forçar os jogadores a se afastarem de suas táticas regulares.

  • Este monstro só pode ser morto por prata (ou sal, ou fogo, ou música, ou qualquer outra coisa).
  • O monstro não pode ser morto enquanto estiver em contato com a terra.
  • Este monstro só pode ser afogado.
  • Este monstro só morrerá se for fisicamente removido de seu túmulo.
  • Este monstro não pode ser ferido por nada criado por mãos humanas.

Geralmente, você deve contar aos jogadores sobre a fraqueza logo no início para deixar que eles descubram a melhor maneira de resolver o problema. Se quiser colocar seus jogadores contra um monstro sem ter chance de saber como matá-lo, pelo menos permita que eles fujam facilmente.

#3. O monstro deve ajudar a exploração da masmorra a ser interessante

Se você nunca jogou um jogo OSR, pode estar acostumado a ver o combate começar assim que os jogadores entram em uma sala. Mas há um grande potencial para que interações interessantes (hostis ou não) ocorram antes que a iniciativa seja rolada.

Isso inclui coisas como interpretação e interação com facções. Mas também envolve aspectos como:

  • Homens-agulha feitos de osso impedem qualquer descanso na masmorra. O grupo pode caçá-los e silenciar seus crânios de chocalho.
  • Goblins possuem túneis minúsculos pelos quais se movem entre as salas. O grupo pode bloqueá-los ou remover a armadura e rastejar por dentro eles.
  • Através do buraco da fechadura, pode-se ver um urso-coruja dormindo. Ele é feroz, mas se distrai facilmente com um pedaço de carne que seja grande o suficiente.

É nesse ponto que você pode ser realmente criativo e inserir os problemas mais interessantes do jogo no estilo OSR. No entanto, esses detalhes costumam ficar escondidos dentro da descrição do monstro. O chocalho dos homens-agulha de osso provavelmente será óbvio para o leitor, pois aparece listado como uma habilidade do monstro. Mas os túneis dos goblins podem ser mencionados apenas brevemente na seção de Ecologia da masmorra, onde podem facilmente passar despercebidos. E, embora a descrição do monstro possa mencionar a fome voraz dos ursos-coruja, esse tipo de situação interessante geralmente fica de fora do manual de monstros e é deixado para os escritores de aventuras (o que é uma pena.)

Esse ponto é um dos mais difíceis de abordar, já que ele não se encaixa bem nas seções normais da descrição de um monstro. Ainda assim, vale a pena pensar sobre isso. Um monstro pode ser muito mais do que apenas um conjunto de pontos de vida e habilidades.

Algumas maneiras pelas quais um monstro pode interferir na exploração da masmorra:

  • Ele faz parte de uma facção.
  • Ele bloqueia parte da masmorra. Fator opcional: ele é forte o suficiente para eliminar o grupo inteiro. Fator opcional: ele tem uma fraqueza que pode ser descoberta em outro local da masmorra (funcionando basicamente numa lógica de chave e fechadura).
  • Literalmente uma chave e fechadura: sua morte (ou apaziguamento) desbloqueia um novo caminho. O nível da água abaixa. A necrópole se abre.
  • Ele interfere em algum recurso:
    • Luz
    • Descanso (ex.: não permite que o grupo descanse ou almoce)
    • Cura (ex.: toda cura é reduzida pela metade)
    • Magia
    • Tesouro (ex.: o tesouro é amaldiçoado até que o grupo mate a múmia)
    • Sentidos (ex.: nenhum som pode ser ouvido nos Salões do Silêncio)
    • Ele escava entre as salas, criando novos túneis.
    • Ele tem uma forma de fácil comunicação e/ou observação, conseguindo falar com o grupo enquanto eles navegam pela masmorra. Ele pode querer assustá-los, convencê-los a libertá-lo, etc.
    • Ele pode gerar ilusões.
    • Maldição do Dao: todo dano por queda é dobrado. (E os monstros sabem disso.)

#4. O monstro deve se encaixar no mundo

O monstro precisa se encaixar no mundo de uma maneira que faça sentido. Isso geralmente é ignorado — se você está criando mais um morto-vivo, todo mundo já sabe que ele foi criado por um necromante ou surgiu espontaneamente de um espírito atormentado. Se ele for um ser vivo, vale a pena gastar um momento pensando onde ele come, dorme e caça.

Mas talvez o seu monstro seja algo mais inusitado. Talvez ele seja o anti-fantasma furioso dos não-nascidos. Ou algo específico demais para que o Mestre simplesmente o jogue na masmorra sem uma explicação, como um esquadrão de humanos que luta com granadas. Nesses casos, você precisa dedicar algum tempo para explicar o contexto desse monstro.

Isso pode ser algo complicado, pois você pode ficar dividido entre oferecer uma explicação específica (“Estes são os granadeiros Malthusianos, servos da Montanha da Bruxa.”) ou uma explicação genérica (“Granadeiros são frequentemente contratados por grupos de mercenários.”). Já que queremos que nosso texto escrito pareça confiável, muitas vezes escolhemos apenas uma das opções — mas, claro, nada impede que você forneça 2 ou 3 contextos do porquê o monstro existe no mundo do jogo.

Além disso, considere dar ao monstro conexões acionáveis com o mundo. Um casal de ursos-coruja pode dar a entender a existência de filhotes valiosos por perto. A presença do cavaleiro do dente-de-leão levanta provas de uma aliança com os príncipes das fadas (então o grupo deve tomar ainda mais cuidado). Essa tal vampira tem a espada de Santa Vipera — será que ela é a própria Santa?

Até mesmo um detalhe pequeno, como um grupo de orcs, no qual um deles usa uma armadura novinha em folha, pode levantar questões (e conexões) interessantes ao descrever apenas um simples detalhe.

#5 – O monstro deve ser ameaçador

Claro, seu monstro tem rolagens de ataque e causa dano. Ele certamente representa uma ameaça aos pontos de vida (PV).

Atacar os PVs é a forma mais antiga e mais confortável de ameaçar os jogadores. É também aquela que sempre é aprovada pelo contrato social implícito da mesa. (Os jogadores não reclamam se tomarem 17 pontos de dano. Mas, dependendo do jogo, podem reclamar se a espada deles for corroída, já que isso soa injusto).

A técnica mnemônica para isso é: “ataque todas as partes da ficha de personagem”. Atacar atributos normalmente é aceitável. O inventário também costuma ser um alvo possível — exceto em jogos mais protetivos da 5e. Perda de XP ou níveis é uma opção, mas deve ser usada com cuidado. As habilidades e perícias dos personagens geralmente são consideradas zonas proibidas, mas você ainda pode mexer com elas de formas divertidas. Na 5e, você pode ter monstros com habilidades que afetem a Inspiração, cura com dados de vida, proficiência, ideais, etc.

Mas lembre-se de que você também pode atacar recursos fora de combate. Tempo é um dos principais. Barulho pode atrair monstros errantes. Um monstro como um carbúnculo pode ter uma joia valiosa nas costas que perde valor a cada rodada de combate. Matar aqueles anões (assassinos e em frenesi) pode arruinar sua reputação com os anões (amigáveis e tranquilos) da próxima caverna.

A ameaça é uma das melhores formas que um monstro pode interagir com seus jogadores, então pense sobre isso com atenção.

#6 – O monstro deve surpreender

Já toquei nesse ponto antes, mas o seu encontro deve ser dinâmico. Ele deve forçar os jogadores a mudar um pouco os seus planos.

Idealmente, você quer empurrar os jogadores em direção a pelo menos três decisões interessantes.

Um exemplo simples disso pode ser:

  • Há um golem gigante na próxima sala. Como matamos ele e/ou passamos por ele?
  • O golem gigante está sendo controlado por caras pequeninos dentro dele. Como matamos os caras pequenos dentro do cara grandão? Podemos fazer uma bomba de fumaça? Será que alguém consegue se enfiar lá dentro?
  • Um dos carinhas está correndo para pedir ajuda. Devemos persegui-lo? Quem vai atrás dele?

Sem nenhuma surpresa, o grupo usará sempre as mesmas velhas táticas.

#7 – O monstro deve recompensar

XP é uma recompensa entediante. Literalmente a pior.

Passar pelo monstro já costuma ser uma recompensa suficiente, se houver mais masmorra legal para explorar.

Mas pense também nas outras possíveis recompensas que os jogadores podem obter desse encontro e talvez inclua algumas.

  • Um novo aliado.
  • Informação.
  • Partes deliciosas do monstro para comer.
  • Armas e ferramentas úteis.
  • Ouro valioso ou ovos de monstro.
  • Consumíveis estranhos, como poções e glândulas de ácido.
  • Um novo atalho dentro da masmorra.
*1 "Trancas absolutas", “hard lock” no original. No vocabulário dos jogos, principalmente em video-games, trata-se de formas absolutas de impedir o progresso do jogador. Em Super Metroid, por exemplo, portas de cores diferentes da cora azul só podem ser abertas utilizando armas específicas: portas rosas só abrem se o jogador atirar nelas com "mísseis", portas amarelas só abrem com "super bombas", etc. Esse tipo de design impede que os jogadores acessem certas áreas do mapa.
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