Título original: "Three Clue Rule"
Escrito originalmente por Justin Alexander em seu blog intitulado "The Alexandrian" em 9 de maio de 2008. Links originais ainda funcionando foram mantidos e links quebrados foram substituídos. Traduzido por Felipe Tuller.
Cenários de mistério para jogos de RPG ganharam a reputação de se transformarem em perfeitos desastres: Os PJs acabarão se desviando descontroladamente do curso ou falhando em encontrar uma pista específica e todo o cenário irá parar completamente ou cair desesperadamente do penhasco mais próximo. Os jogadores ficarão incertos do que deveriam estar fazendo. O Mestre sentirá como se tivesse feito algo errado. E toda a noite provavelmente terminará em tédio, frustração ou ambos.
Aqui está um exemplo típico: Quando os PJs se aproximam de uma cena de assassinato eles não vasculham por fora da casa, então eles nunca encontram as pegadas de lobo que se transformam em pegadas de um humano. Eles falham no Teste para Procurar as cartas de amor escondidas, então eles nunca se dão conta de que ambas as mulheres estavam sendo cortejadas pelo mesmo homem. Eles encontram a caixa quebrada com o escrito CARNES DE DANNER, mas em vez de voltar para interrogar o açougueiro local com quem falaram mais cedo, eles decidem ir vigiar a fábrica de processamento de carne mais próxima.
Como resultado de problemas como esses, muitas pessoas chegam a uma conclusão errônea: Cenários de mistério em RPGs são uma má ideia. Em um típico mistério de assassinato, por exemplo, o protagonista é um detetive brilhante. Os jogadores provavelmente não são detetives brilhantes. Portanto, cenários de mistério são impossíveis.
Ou, como alguém me disse uma vez: "Os jogadores não são o Sherlock Holmes."
Embora a conclusão seja incorreta, há um elemento de verdade nisso. Por exemplo, em Um estudo em vermelho, Sherlock Holmes está investigando a cena de um assassinato. Ele descobre um pequeno monte de cinzas no canto da sala. Ele os estuda cuidadosamente e é capaz de concluir que as cinzas vieram de um charuto Trichinopoly.
Agora, vamos analisar como este exemplo relativamente menor de dedução Holmesiana se desenrolaria na mesa de jogo:
- Os jogadores precisariam ser bem-sucedidos em vasculhar a sala.
- Eles precisariam ter interesse o suficiente em relação às cinzas para examiná-las.
- Eles precisariam ser bem-sucedidos em um teste de perícia para identificá-las.
- Eles precisariam utilizar esse conhecimento para chegar à conclusão correta.
São quatro potenciais instâncias de falha: Os PJs podem falhar ao vasculhar a sala (ou porque os jogadores não tiveram esta ideia ou porque seus testes de perícia foram ruins). Os PJs poderão falhar ao examinar as cinzas (porque não as consideram importantes). Os PJs poderão falhar no teste de perícia para as identificar. Os PJs podem falhar fazendo uma dedução incorreta.
Se compreender corretamente esta pista é, de fato, essencial para o progresso de aventura — se, por exemplo, os PJs precisam ir à loja de charutos mais próxima e começar a fazer perguntas — então a pista serve como ponto de obstrução1
: Ou os PJs entendem a pista ou dão de cara na parede.
Os pontos de obstrução no design de aventura são sempre um grande problema e precisam ser evitados, mas podemos ver que, quando se trata de um cenário de mistério, o problema é muito pior: cada pista não é apenas um ponto de obstrução, na verdade são vários ponto de obstrução.
Então a solução aqui é simples: Remova os pontos de obstrução
A trilha de migalha de pão
Para o sistema GUMSHOE (usado em The Esoterrorists, Fear Itself e The Trail of Cthulhu2), Robin D. Laws decidiu se livrar do conceito de encontrar pistas. Em cada "cena" de um cenário de investigação, há uma "pista". É automaticamente assumido que os investigadores vão encontrar essa pista.
Isso remove três dos nossos quatro pontos de obstrução, deixando apenas a necessidade de usar a pista para fazer a dedução correta (ou seja, a dedução que nos leva para a próxima "cena" na qual a próxima pista pode ser transmitida). E, no caso do sistema GUMSHOE, mesmo este passo pode ser abordado mecanicamente (com os jogadores gastando pontos das habilidades de seus personagens para receber "deduções" gradualmente mais precisas do Mestre).
Esta é uma solução mecânica para o problema. Mas embora possa resultar em uma sessão de jogo que segue superficialmente a estrutura de uma história de mistério, acho que não funciona porque não parece de verdade como se você estivesse jogando um mistério.
O erro fundamental de Laws, eu acho, é assumir que uma história de mistério é fundamentalmente sobre seguir uma "trilha de migalhas de pão" de pistas. Aqui está uma citação de um ensaio de design sobre o assunto:
Eu argumentaria, em primeiro lugar, que esses medos são inapropriados, e surgem de uma percepção errônea fundamental. A trilha de pistas, ou enredo de migalhas de pão, não é a história e não constitui uma experiência pré-roteirizada. O que os PJs escolhem fazer, e como eles interagem uns com os outros enquanto resolvem o mistério, é a história. Como mencionado nas regras de The Esoterrorist, vimos isso acontecendo durante o playtest, como todos os grupos tiveram experiências muito diferentes do cenário de amostra, como cada casamento de Mestre e jogadores improvisou maneiras próprias e diferentes das situações sugeridas.Mas, na verdade, este tipo simplista de narrativa "A leva a B que leva a C que leva a D" não é típico do gênero mistério. Para utilizar um contraexemplo relativamente simplista, voltemos a Sherlock Holmes em Um estudo em vermelho:
WATSON: “Isso parece bastante simples”, disse eu; “mas e quanto à altura do outro homem?”
HOLMES: “Ora, em nove entre dez casos a altura de um homem pode ser determinada pelo comprimento de seu passo. É um cálculo razoavelmente simples, embora seja inútil eu aborrecê-lo com números. Eu tinha o passo desse sujeito tanto na argila fora da casa como na poeira, dentro. Depois tive uma maneira de verificar meu cálculo. Quando um homem escreve numa parede, seu instinto o leva a fazê-lo acima do nível de seus olhos. Ora, aquela palavra está a pouco mais de um metro e oitenta do chão. Foi uma brincadeira de criança.3
Esta é apenas uma pequena dedução em um mistério muito maior, mas você notará que Holmes de fato reuniu várias pistas, estudou-as e depois destilou uma conclusão delas. E esta é, de fato, a estrutura típica do gênero mistério: O detetive lentamente reúne um conjunto de evidências até que, finalmente, surge uma conclusão. Nas famosas palavras do próprio Holmes, "Quando eliminamos o impossível, o que resta, por mais improvável que seja, deve ser a verdade."4
O que é verdade, no entanto, é que em muitos casos é necessário que muitas deduções menores sejam feitas para que todas as evidências necessárias para resolver o mistério sejam reunidas. No entanto, como o exemplo de Um estudo em vermelho demonstra, mesmo essas deduções menores podem ser baseadas em um conjunto de evidências e não apenas numa pista isolada.
Esta observação nos leva, inexoravelmente, à solução que temos procurado.
A Regra das Três Pistas
Sempre que você for criar um cenário de mistério, você deve invariavelmente seguir a Regra das Três Pistas:
Para cada conclusão que você queira que os PJs façam, inclua pelo menos três pistas.
Por que três? Porque os PJs provavelmente perderão a primeira; ignorarão a segunda; e interpretarão mal a terceira antes de fazer algum salto lógico incrível que os levará aonde você queria que eles fossem desde o começo.
Estou brincando, é claro. Mas se você pensar em cada pista como um plano (os PJs vão encontrar A, concluir B e ir para C), então quando você tem três pistas você não tem só um plano — você também tem dois planos na reserva. E quando você se der conta de que seus planos nunca sobrevivem ao contato com os jogadores, a necessidade desses planos reservas se torna clara.
Na melhor das hipóteses, é claro, os jogadores encontrarão as três pistas. Não há nada de errado nisso. Eles podem usar essas pistas para confirmar suas suspeitas e reforçar suas conclusões (assim como Sherlock Holmes).
Na pior das hipóteses, eles devem ser capazes de usar pelo menos uma dessas pistas para chegar à conclusão certa e manter a aventura em movimento.
E aqui vai uma dica importante: Não há exceções à Regra das Três Pistas.
"Mas Justin!" Eu ouço você dizer. "Essa pista é muito óbvia. Não há como os jogadores não matarem a charada."
Na minha experiência, você provavelmente está errado. Em primeiro lugar, você é o único que está criando o cenário. Você já sabe qual é a solução para o mistério. Isso torna muito difícil para você julgar objetivamente se algo é óbvio ou não.
E mesmo se você estiver certo, e daí? Ter pistas extras não vai causar nenhum problema. Não é melhor prevenir do que remediar?
Estendendo a Regra das Três Pistas
Se você pensar em um sentido mais amplo, a Regra das Três Pistas é realmente uma boa ideia para se ter em mente quando você está projetando qualquer cenário.
Richard Garriott, o designer dos jogos de computador Ultima e Tabula Rasa, disse uma vez que seu trabalho como designer de jogos era garantir que pelo menos uma solução para um problema fosse possível sem impedir o jogador de encontrar outras soluções por conta própria. Por exemplo, se você encontrar uma porta trancada em um jogo da série Ultima, haverá uma chave para essa porta em algum lugar. Mas você também pode abrir caminho na violência; ou destrancar a fechadura; ou levar um canhão até ela e a explodir.
Warren Spector, que começou a trabalhar com Garriott em Ultima VI, viria a criar o jogo Deus Ex. Ele segue a mesma filosofia de design e fala entusiasticamente da emoção que ele sente ao assistir alguém jogar seu jogo e pensar: "Espere aí... Isso aqui vai dar certo?"
Ao projetar uma aventura, eu realmente tento levar essa filosofia de design um passo adiante: Para cada problema em particular, eu me certifico de que haja pelo menos uma solução, e que ela permaneça completamente aberta a qualquer solução que os jogadores possam criar por conta própria.
Mas, para cada ponto de obstrução problemático, eu me certifico de que há pelo menos três soluções.
Por ponto de obstrução, quero dizer qualquer problema que deve ser resolvido para que a aventura continue.
Por exemplo, digamos que há uma porta secreta atrás da qual está escondido algum tesouro aleatório, algo nada importante. Encontrar a porta secreta é um problema, mas não é um ponto de obstrução, então só preciso encontrar uma solução. Em D&D esta solução é fácil porque está inclusa nas regras: A porta secreta pode ser encontrada com um teste de Procurar bem-sucedido.
Mas digamos que, em vez de algum tesouro aleatório, há algo de importância absolutamente vital atrás daquela porta. Para a aventura funcionar, os PJs devem encontrar essa porta secreta.
A porta secreta é agora um ponto de obstrução problemático e por isso vou tentar me certificar de que há pelo menos três soluções. A primeira solução permanece a mesma: Um teste de Procurar bem-sucedido. A isso poderíamos acrescentar um panfleto em um local diferente onde um cultista é instruído a "esconder o artefato atrás da estátua de Rá" (onde a porta secreta está); um diário muito danificado que faz referência à porta, escrito pelo arquiteto da locação; uma segunda porta secreta que conduz ao mesmo local (isto conta como uma solução separada, porque introduz imediatamente a possibilidade de um segundo teste de Procurar); um cenário provável em que o vilão central tentará fugir através da porta secreta; a capacidade de interrogar cultistas capturados; e assim por diante.
Depois de identificar um ponto de obstrução como este, torna-se bastante trivial começar a adicionar soluções como essas.
Eu ouvi alguns Mestres argumentarem que isso torna as coisas "muito fáceis". Mas a realidade é que soluções alternativas como essa tendem a tornar o cenário mais interessante, não menos interessante. Veja nossa porta secreta, por exemplo: antes de começarmos a adicionar soluções alternativas, era apenas uma rolagem de dados. Agora é projetada por uma pessoa específica; usado por cultistas; e potencialmente explorada como uma rota de fuga.
À medida que você começa a aplicar essas técnicas da Regra das Três Pistas, você verá que seus cenários se tornam ainda mais robustos. Por exemplo, vejamos um mistério de assassinato em que o assassino é um lobisomem que caça seus ex-amantes. Descobrimos três formas possíveis de identificar o assassino:
- Patrulhar as ruas da pequena cidade na noite de lua cheia.
- Identificar todas as vítimas como sendo ex-amantes do mesmo homem.
- Visitar o açougue local onde o assassino trabalha e encontrar as suas confissões de pecados e pesadelos escritas com sangue nas paredes da sala traseira.
Para cada uma dessas conclusões (ele é um lobisomem; ele é um ex-amante; nós devemos verificar o açougue) vamos precisar de três pistas.
ELE É UM LOBISOMEM: pegadas que se transformam de pegadas de lobo em pegadas humanas. Vítimas com marcas de garras de tamanho anormal. Uma das vítimas tinha uma arma carregada com balas de prata.
ELE É UM EX-AMANTE: Cartas de amor escritas pelo mesmo cara. Um diário escrito por uma vítima descrevendo como ele a traiu com outra vítima. Fotos do mesmo cara ou na posse das vítimas ou guardadas em algum local de suas casas.
VERIFIQUE O AÇOUGUE: um caixote quebrado com os dizeres CARNES DO DANNER numa das cenas do crime. Um bilhete dizendo "me encontre no açougue" amassado e jogado em uma cesta de lixo. Uma anotação dizendo "encontrar P no açougue" na agenda de uma das vítimas.
E assim de repente você criou um cenário com nove caminhos distintos para o sucesso. E se você mantiver sua mente aberta para a ideia de "mais pistas são sempre melhores" enquanto você está criando a aventura, você encontrará ainda mais oportunidades. Por exemplo, quão trivial seria colocar uma referência ao açougue em uma dessas cartas de amor? Ou preencher o diário com esboços de lobos feitos por alguém à beira da loucura?
A parte divertida de tudo isso é que, uma vez que você se deu permissão para incluir muitas pistas, você se deu a oportunidade de incluir algumas pistas realmente esotéricas e sutis. Se os jogadores as desvendarem, vão se sentir incríveis por o terem feito. Se eles não as notarem ou não as entenderem, tudo bem também: Você tem muitas outras pistas para eles buscarem (e uma vez que eles resolvam o mistério, eles vão gostar muito de lembrar dessas pistas esotéricas e tentar entender o que elas queriam dizer).
Corolário: Aquisição permissiva de pistas
A máxima "mais pistas são sempre melhores" é importante. Ao criar um mistério, há um impulso natural eu acho, de querer reter informações. Esta é a inclinação lógica: Afinal de contas, um mistério é essencialmente definido pela falta de informação. E há uma diferença entre ofertar muitas pistas e fazer com que o assassino escreva com sangue o endereço da sua casa na parede.
Mas o desejo de reter informações faz mais mal do que bem, eu acho. Sempre que você retém uma informação específica, você está essencialmente fechando um caminho para um sucesso em potencial. Isso remonta ao conselho de Garriott: A menos que haja alguma razão pela qual a porta deve ser à prova de canhões, o jogador deve ser recompensado por sua sagacidade. Ou, em outras palavras: Só porque você não deve deixar a chave de uma porta trancada no chão em frente à própria porta, isso não significa que não deve haver várias maneiras de passar pela porta trancada.
Com isso em mente, você deve se abrir conscientemente para a aquisição permissiva de pistas. Com isso, quero dizer que se os jogadores fizerem uma abordagem inteligente durante a investigação, você deve ser receptivo à ideia de fornecer informações úteis como resultado.
Aqui vai outra maneira de pensar sobre isso: Não trate a lista de pistas que você criou durante a preparação como uma camisa de força. Ao invés disso, pense nesse trabalho de preparação como sua rede de segurança.
Eu costumava ficar muito apegado às soluções mais sagazes enquanto eu as criava. Eu me apegava emocionalmente à ideia de meus jogadores descobrindo essa solução sagaz que eu havia criado. Como resultado, eu tendia a vetar outras soluções possíveis que os jogadores inventavam — afinal, se essas outras soluções funcionassem, eles nunca descobririam a solução sagaz que eu havia criado.
Com o passar do tempo, eu aprendi que é muito mais divertido quando os jogadores me surpreendem. É a mesma razão pela qual evito manipular os dados5 para preservar qualquer presunção dramática que eu tenha inventado. Como resultado, agora costumo pensar na minha solução predeterminada como o pior cenário possível — a rede de segurança que se arma de repente quando meus jogadores não conseguem pensar em algo mais interessante.
Para poder estar aberto à aquisição permissiva de pistas, você primeiro precisa entender a situação subjacente. (Quem é o lobisomem? Como ele matou suas vítimas? Por que ele as matou? Quando ele as matou?) Em seguida, abrace as ideias e abordagens inesperadas que os PJs terão e apoie-se no lado permissivo ao decidir se eles podem ou não encontrar uma pista que você não havia cogitado anteriormente.
Corolário: Pistas Proativas
Também conhecido como: jogue-as na cara deles.
Às vezes, apesar de seus melhores esforços, os jogadores vão se meter em um beco sem saída: Eles não sabem o que as pistas significam, ou eles estão ignorando as pistas, ou eles usaram as pistas para chegar a uma conclusão incorreta e agora estão indo numa direção completamente errada. (Quando estou usando a Regra das Três Pistas, acho que isso acontece com mais frequência quando os PJs não percebem que de fato há um mistério que precisa ser resolvido — nem todo mistério é tão óbvio quanto um cadáver, afinal.)
Este é o momento em que ter um plano na reserva é útil. O problema nessa situação é que os PJs estão sendo muito passivos — ou porque não têm as informações de que precisam ou porque estão usando as informações de maneira errada. A solução, portanto, é que algo ativo aconteça com eles.
O conselho de Raymond Chandler para esse tipo de impasse foi: "Faça com que um cara armado entre pela porta."
Minha alternativa típica é algo similar: o vilão descobre que eles estão investigando o crime e envia alguém para matá-los ou suborná-los.
Outra boa é "outra pessoa morre". Ou, em um sentido mais geral, "a próxima parte do plano do vilão acontece". Isso tem o efeito de criar proativamente um novo local ou evento para os PJs interagirem.
A ideia por trás disso tudo, é claro, não é simplesmente "fazer algo acontecer". Você quer especificamente que o evento lhes dê uma nova pista (ou, melhor ainda, várias pistas) nas quais eles possam se apoiar.
Na pior das hipóteses, no entanto, você pode criar uma carta de "Saída Grátis da Prisão" que você pode usar para levar o cenário a um final satisfatório, não importa o quanto os PJs se embananem. Por exemplo, em nosso mistério do lobisomem — se os PJs se perderem completamente — você pode simplesmente fazer o lobisomem aparecer e tentar matá-los (porque ele acha que eles estão "chegando muito perto"). Isto geralmente é pouco satisfatório, mas pelo menos tira você de uma situação ruim. É a reserva final quando todas as outras reservas falharam.
Corolário: Pistas falsas são supervalorizadas
Pistas falsas6 são um elemento clássico do gênero de mistério: Todas as evidências apontam para X, mas é uma pista falsa! O verdadeiro assassino é Y!
Quando se trata de projetar um cenário para um RPG, no entanto, pistas falsas são superestimadas. Eu não vou chegar ao ponto de dizer que você nunca deve usá-las, mas vou chegar ao ponto de dizer que você só deve usá-las com extrema cautela.
Há duas razões para isso:
Primeiro, conseguir que os jogadores façam as deduções que eles deveriam fazer é bastante difícil. Colocar uma pista falsa no meio só torna tudo ainda mais difícil. Mais importante, no entanto, uma vez que os jogadores tenham chegado a uma conclusão, eles tendem a se agarrar a ela. Pode ser extremamente difícil convencê-los a largar mão e reavaliar as evidências. (Uma das maneiras de fazer uma pista falsa funcionar é garantir que haverá uma refutação absolutamente incontestável a ela: Por exemplo, os assassinatos continuam mesmo depois que os PJs prendem um suspeito. Infelizmente, seu conceito de uma "refutação incontestável" pode ter tanta lógica quanto "uma pista incrivelmente óbvia impossível de ser esquecida".)
Em segundo lugar, não há nenhuma necessidade para você criar uma pista falsa: É quase certo que os jogadores inventarão uma para você. Se você rechear sua aventura com nada além de pistas apontando conclusiva e decisivamente para o verdadeiro assassino, posso praticamente garantir que os jogadores vão suspeitar de pelo menos três outras pessoas antes de descobrir quem está realmente por trás de tudo aquilo. Eles vão ficar muito apegados a essas suspeitas e começarão a tecer teorias complicadas explicando como a evidência que eles têm aponta para o suspeito que eles querem.
Em outras palavras, o grande truque em criar um cenário de mistério é tentar evitar um acidente de carro. Jogar pistas falsas na mistura é como embebedar os jogadores antes de colocá-los atrás do volante do carro.
Corolário: Nada é Infalível
Você definiu cuidadosamente um cenário no qual há vários caminhos para a solução, com cada passo ao longo de cada caminho apoiado por dezenas de pistas. Você até tem alguns planos proativos na reserva criados para colocar os PJs de volta nos trilhos se as coisas derem errado.
Nada poderia dar errado!
... por que você diria uma coisas dessas?
A verdade é que, mais cedo ou mais tarde, seus planos vão dar errado. Quando isso acontecer, você vai querer estar preparado para a possibilidade de ter que improvisar novos planos reserva em tempo real.
Aqui está uma citação de um excelente ensaio de Ben Robbins:
Armas normais não podem matar os zumbis. Microman não confia no Capitão Fury. O monstro do lago é na verdade o velho Wiggins usando uma máscara de borracha.Eu recomendo demais este ensaio. Ele diz praticamente tudo o que eu estava planejando incluir na minha discussão deste corolário final, então não vou perder meu tempo reformulando algo que já foi escrito tão bem. Em vez disso, vou me satisfazer apenas citando esta pequena dica de lá:
Estas são "Revelações". Eles são coisas que você quer que os jogadores descubram para que eles possam fazer boas escolhas ou apenas entender o que está acontecendo no jogo. Revelações avançam o enredo e tornam o jogo dramaticamente interessante. Se os jogadores não as encontram (ou não as encontram no momento certo), elas podem estragar o seu jogo.
Anote suas Revelações: Anotar suas revelações com antecedência te mostra como o jogo vai fluir. Uma vez que o jogo começa, as coisas podem ficar um pouco frenéticas — você pode acidentalmente ter o gênio do mal aparecendo e entregando seu ultimato e saindo fora sem se lembrar de soltar aquela dica chave que levaria os heróis à sua base. Se você tiver sorte, você reconhecerá a omissão e poderá voltar atrás. Se você não tiver sorte, você não notará nada e passará o resto do jogo se perguntando por que os jogadores têm uma ideia tão diferente do jogo comparado a você.Como discutimos, uma maneira de evitar esse tipo de problema é evitar ter "uma dica chave" sobre a qual a aventura depende. Mas o conselho de "anotar suas Revelações antecipadamente" é excelente. Como Robbins diz, ela "deve ser uma lista de verificação ou alguns gatilhos, não toda a explicação".
O que eu recomendo é listar cada conclusão que você quer que os jogadores alcancem. Sob cada conclusão, liste todas as pistas que possam levá-los a essa conclusão. (Isso também pode servir como uma boa lista de design para garantir que você tenha pistas suficientes para apoiar cada conclusão.) À medida que os PJs recebem as pistas, risque-as da lista. (Isto lhe permite ver, de cara, se há áreas nas quais os PJs estão perdendo pistas.)
Finalmente, ouça atentamente o que os jogadores estão dizendo uns aos outros. Quando eles finalmente chegarem a uma conclusão específica, você poderá riscar aquela conclusão inteira da sua lista. (Tenha cuidado para não risca-la assim que a considerarem como uma possibilidade. Risque apenas quando eles de fato tiverem concluído que é verdade.)
Se você notar que muitas pistas para uma conclusão estão sendo perdidas, ou que todas as pistas foram encontradas, mas os jogadores ainda não desvendaram o mistério, então você saberá que provavelmente é hora de começar a pensar em novas pistas que podem ser introduzidas na aventura.
Conclusão
Basicamente, tudo isto se resume a algo simples: Planeje diversos caminhos para o sucesso. Incentive a criatividade do jogador. Dê a si próprio um dispositivo de segurança.
E lembrem-se da regra das três pistas:
Para cada conclusão que você queira que os PJs façam, inclua pelo menos três pistas.
1 ↩ "chokepoint" no original, ou "ponto de estrangulamento" em tradução livre. A expressão é usada para designar "afunilamento", "estreitamento", "bloqueio". A expressão é utilizada, por exemplo, para fazer referência a um engarrafamento na entrada de um túnel.
2 ↩ Infelizmente, de todos os sistemas citados, apenas Trail of Cthulhu está disponível em português. Você pode encontrá-lo na loja da Editora Retropunk sob o nome de Rastro de Cthulhu.
3 ↩ Fonte da tradução: DOYLE, A. C. Um estudo em vermelho. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
4 ↩ a citação aparece na obra O Signo dos quatro. Fonte da tradução: DOYLE, A. C. O Signo dos quatro. Trad. Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2015.
5 ↩ no original: "fudging the dice roll". Trata-se do recurso de informar aos jogadores um resultado diferente daquele mostrado pelo dado para melhor controlar o resuldado de suas ações. Note que este recurso pressupõe que o Mestre está usando um Escudo de mestre ou algo semelhante para esconder as rolagens de dado dos demais participantes.
6 ↩ no original: "Red Herring", literalmente traduzido como "arenque vermelho". Segundo o artigo da Wikipedia sobre o assunto, "O termo "arenque vermelho" foi popularizado em 1807 pelo polemista inglês William Cobbett, em uma história em que se usa um peixe defumado de cheiro forte para enganar e distrair cães de caça, demovendo-os de perseguir uma lebre."
Nenhum comentário:
Postar um comentário