Título original: "Impact" Escrito originalmente por Arnold Kemp no seu blog intitulado "Goblin Punch" em 05 de outubro de 2017.
Traduzido por Felipe Tuller.
Links
originais foram mantidos.
Então, você está jogando D&D e está lutando contra alguns orcs. Todos os orcs estão armados com espanadores de pena, então na verdade eles são incapazes de machucarem qualquer um. E o seu Mestre não premia XP por combate, então eles dão 0 de XP ao serem mortos.
Esse combate é uma perda de tempo. Você está apenas rolando dados até que os orcs morram.
O encontro é uma bosta porque o encontro não causa impacto.
Impacto: a habilidade de alterar permanentemente o jogo. O oposto de impacto é "fluff". *1
Impacto se relaciona com o quanto seus jogadores se importam. Se ninguém está dando atenção ao resultado deste encontro, é difícil se divertir. Eu acho que muitos Mestres cometem o erro de criar encontros de baixo impacto.
Vou começar falando sobre encontros de combate, mas boa parte disso aqui também se aplica a encontros não relacionados a combate.
Como aumentar o impacto
Esgotar recursos
Sim, esgotar magias/PVs/poções é uma forma de impacto. É baixo impacto, quase que por definição. Podemos fazer melhor.
Em muitas aventuras publicadas, as lutas são fortemente inclinadas em favor dos PJs, que normalmente não precisam gastar muitos recursos para vencer. O único motivo para rodar encontros como esse é fazer os jogadores se sentirem bem/poderosos (não é algo que eu recomendo que você crie de caso pensado - isso acontece por si só, quando é algo merecido) ou para ensinar as regras a eles (e há maneiras melhores de fazer isso do que gastar o tempo de todos com encontros no estilo "fluff").
Matando personagens
Para a maioria dos jogadores, essa é a coisa mais impactante que pode acontecer. É também meio merda quando acontece. Nós podemos conversar sobre o quanto de letalidade é desejável em outra postagem, mas meu ponto é o seguinte...
Alto risco faz com que as pessoas prestem atenção. Por esse motivo, combates difíceis são necessariamente algo de alto impacto.
Caros leitores de fora da OSR: essa é uma das razões pelas quais o pessoal da OSR está sempre advogando a favor de combates potencialmente letais. Não porque nós gostamos de criar novos personagens, mas porque os combates são mais significativos. É a mesma razão pela qual muitos Mestres de mesas "sandbox" aceitam jogadores depondo reis, queimando cidades inteiras e basicamente só criando uma grande confusão.
Eu não vou argumentar a favor de que você deva tornar todos os seus combates algo brutalmente difícil. Combates fáceis tem o seu lugar. Mas se você vai criar um combate fácil, ele precisa ser impactante de alguma outra maneira (veja também: o restante desta postagem).
É perfeitamente possível que um combate de alta letalidade mantenha todos atentos, estressados e entediados. Ficar preso numa sala com um Wight, sem nenhuma maneira de feri-lo, rolando dados por 20 minutos enquanto todos os seus personagens morrem inevitavelmente (isso não é diferente dos orcs com espanadores, na verdade).
Se você se encontrar em um combate de baixo impacto, desconsidere-o. Na última vez que joguei D&D, meus jogadores emboscaram três clérigos velhinhos (não mágicos, nível zero). O combate durou 30 segundos, porque eu simplesmente deixei que os jogadores narrassem como eles venceram.
Mutando a ficha de personagem
Quando eu digo "ataque todas as partes da ficha de personagem", e a isso que me refiro.
Esta é uma categoria bem ampla. Sim, ela inclui mutações de fato. Este sou eu lhe dizendo que dar um Machado de Mutação ao orc saqueador é uma excelente ideia.
Você pode destruir itens (monstros da ferrugem), drenar níveis (Wight), etc. (Anúncio de utilidade pública: efeitos negativos dessa magnitude devem ser telegrafados, e os jogadores devem ter a chance de evitar o combate. Não embosque os jogadores usando Wights).
Você também pode mutar itens, mutar feitiços, transformar moedas de ouro em moedas de cobre, transformar moedas de cobre em moedas de prata, cegar um PJ permanentemente, dar a um jogador a habilidade de enxergar no escuro permanentemente, bagunçar seus atributos, bagunçar suas perícias, roubar um item de seu inventário, queimar todos os pergaminhos de seu inventário com fogo de dragão, trocar seu sexo, amaldiçoá-los.
E lembre-se, todos esses efeitos devem ser telegrafados antes de serem jogados em cima do grupo. A ideia é fazer com que o grupo dê atenção ao resultado ao subir as apostas, então isso não funciona se eles não souberem que as apostas subiram.
Anjos que podem converter os personagens à força para a sua religião. Já que demora alguns "acertos" antes que os PJs sejam convertidos, eles têm tempo para fugir (que é o objetivo dos PVs, afinal).
Ninfas que convencem os PJs a viver com ela por dois anos também podem ter um grande impacto no jogo. Os jogadores devem conhecer os riscos antes de procurar uma ninfa.
E todo mundo sabe que se deve evitar gurgans. Eca.
"Eu vasculho o corpo"
É, o básico do básico. Eu sei.
DICA DE MESTRE: aumente o engajamento fazendo com que os inimigos utilizem os itens legais em combate; não deixe-o no bolso deles para que eles descubram no fim da luta.
Não precisa nem ser algo mágico. Tipo, dê a um dos orcs um chicote com uma garra de águia na ponta e um crânio de água na empunhadura. Foda pra caralho.
Ou então eles têm poções malucas. Perca 1 ponto de CON permanentemente para entrar numa super-fúria. Faça com que pelo menos um orc beba a poção durante o combate, com mais frascos visíveis dentro do casaco dele para que os jogadores saibam o que receberão quando vencerem.
Ou então, tipo, da próxima vez que os jogadores critarem*2 o orc, a algibeira de moedas do orc rasga e moedas saem rolando pelo chão (além dos efeitos usuais de um crítico). Mostre aos jogadores o quê está em jogo.
Ganhando XP
Sim, esse tipo de coisa existe.
Quando eu usava XP para quests nas minhas mesas de Pathfinder, eu costumava dar um panfleto aos jogadores com todas as quests disponíveis, com todas as recompensas associadas. Eu meio que reviro os olhos pra esse tipo de coisa hoje em dia, mas isso cumpria o objetivo de mostrar o quê estava em jogo.
Relacionar com outras partes do mapa
É a isso que me refiro quando eu digo "encontros aleatórios não significam encontros desconexos".
Talvez o orc super bem vestido seja o filho do líder e peça para ser resgatado quando se render (encontros aleatórios precisam se conectar com coisas foras de si mesmas).
Talvez eles estejam salvando a vida do rei. Se forem derrotados nesse combate, o rei será assassinado.
Essa é também uma oportunidade para os jogadores mostrarem os seus valores. Deixe que eles tenham a possibilidade de alterar o mapa de jogo, e garanta que eles saibam disso.
Informação
Talvez o simples fato de um dos orcs estar no castelo signifique que alguém botou ele pra dentro... mas por quê?
Talvez um dos orcs tenha um mapa incompleto de uma masmorra próxima.
Talvez os orcs prometam lhe dar a senha para a Torre do Wyvern se você os deixar fugir.
Os orcs tem suas mãos tatuadas de preto, indicando que eles treinaram em Ungra, especializados em matar magos, e foram contratados por um preço bem caro.
Um dos orcs está carregando ferramentas de ladrão e está coberto de queimaduras de ácido bem recentes (um cadeado próximo possui armadilhas de mangueiras com ácido).
Fluff é aceitável
Não há nada de errado num combate divertido. Fluff tem o seu lugar.
Descanso: Combates fáceis podem ser um ótimo descanso depois de uma matança.
Delírio de poder: Talvez você esteja jogando com crianças de dez anos e o aniversariante do dia se sentiria feliz com uma espada mágica.
Ambiente: Um corpo sendo devorado por fantasmas famintos pode estabelecer bem o clima (nenhuma informação útil foi adquirida, nenhuma interação real exceto observação).
Objetivos pessoais: Não há nenhum benefício nisso, mas talvez um dos PJs jurou humilhar todos os bardos que cruzasse seu caminho. Que seja. É importante para o conceito do personagem.
Comédia: Lutar contra goblins bêbados no meio de uma manada de porcos.
Lembre-se apenas de que você pode aumentar o impacto sem aumentar a dificuldade. Talvez dê a um dos goblins um ferrete fervendo. Causa o mesmo dano, mas agora os personagens têm as iniciais "QQ" permanentemente marcadas em seus traseiros.
- Não muda o jogo
- Ainda pode ser interessante (por exemplo, você encontra o homem-pavão sendo devorado por fantasmas famintos; ele não tem nada de interessante para dizer ou lhe dar).
- Pode ser interessante para uma "ego trip".
Usando impacto de forma errada
Impacto não é a mesma coisa que diversão. Use-o para fazer os jogadores reagirem. Talvez eles estejam com medo de morrer e detestem combates mortais. Talvez eles queiram ser heróis e respondem muito bem a heroísmos cívicos, tais como salvar reis.
Então fique atento ao impacto na próxima vez que jogar um grupo aleatório de 3d6 goblins contra o seu grupo. Não deixe que se torne apenas "fluff".
*1 Em sentido literal, "Fluff" significa "algo fofo", como penugem de ovelha ou o material utilizado para estofar ursinhos de pelúcia. No contexto do RPG de mesa, "fluff" pode ser entendido como uma metáfora para algo supérfluo, não essencial ou algo que serve apenas para preencher espaço vazio.
*2 "Crit on the orc" no original. Optamos por traduzir pelo neologismo "critar", comum no vocabulário dos RPGs. Se refere à mecânica de "acerto crítico".